Os sete testes do Guru

«Durante o mês de Outubro de 1971, a Ananda Marga enfrentou uma crise – quer espiritual quer organizacional. Um DMC(congregação espiritual) foi realizado em Calcutá. Estavamos à espera que o discurso da tarde começasse. O procedimento normal era que primeiro, Srimati Uma, a esposa de Baba, chegava e dava uma palestra espiritual. Depois Baba dava o Seu discurso. Costumavamos chamar à esposa de Baba “Ma”, e tinhamos-lhe muito respeito.

Nessa noite de DMC, o assistente pessoal de Baba apareceu subitamente com outros dois ou três trabalhadores centrais e falaram sobre o sistema de relatórios. Começou a falar sobre como Baba dava castigos severos aos trabalhadores. Criticou muito fortemente este ponto assim como outros aspectos do sistema organizacional de Baba. Depois, chocando-nos a todos, anuncia que Srimati Uma não concordava com Baba em muitos dos aspectos organizacionais e que ela, juntamente com o seu filho O iam deixar. Depois dessa forte notícia, Srimati Uma saiu com um grupo dissidente de dadas. Este drama inacreditável aconteceu mesmo em frente aos nossos olhos, durante essa noite no DMC. Estavamos chocados e sem palavras, atirados para uma confusão profunda e sem saber o que fazer.

Como sempre, Baba chegou para o seu discurso da tarde. Estavamos todos muito ansiosos para saber directamente de Baba o que tinha acontecido. No entanto, Baba estava completamente calmo, como se nada tivesse acontecido. Deu o Seu discurso espiritual e depois saiu para casa.

No dia seguinte, todo o programa do DMC correu naturalmente e sem incidentes. Após o DMC, Baba permaneceu em Calcutá por alguns dias. Depois foi para Patna em Bihar.

Nessa altura, eu era um trabalhador de campo da “Área Este”, que englobava toda a parte oriental da Índia. Em Bengal Ocidental, e especialmente perto de Calcutá, haviam muitas unidades da Ananda Marga. Todos os margiis dessas unidades estavam muito desmoralizados por causa deste incidente e, especialmente, porque a tão admirada esposa de Baba e o seu filho O tinham deixado. Não conseguiam aceitar este doloroso facto. Para mim, foi muito difícil enfrentar os margiis e dar uma resposta satisfatória para as suas inúmeras perguntas.

Ninguém conseguia, nem queria, acreditar que a esposa do nosso Guru, Anandamurtiji, poderia te-Lo deixado e abandonado a organização. Pessoalmente, eu também me questionava como é que isso tinha sido possível. Mas o incidente aconteceu mesmo à minha frente. Também tinha visto Baba continuar a desempenhar os Seus deveres de uma forma calma e serena como se nada tivesse acontecido. Embora estivesse magoado e confuso, fiquei algo contente que este incidente não tivesse perturbado Baba de forma alguma. Foi, no entanto, um tempo muito difícil para mim. Sempre que encontrava margiis, faziam-me perguntas difíceis sobre o ocorrido, o que também mexia comigo, visto eu não conseguir responder de forma adequada ou convincente. Eventualmente, comecei a ficar cada vez mais agitado.

Chegou a um ponto em que não conseguia aguentar mais. A agonia era insuportável. Como era possível ter abandonado Baba? Será que ela não era uma pessoa realizada? Se ela, enquanto Sua mulher, não conseguia perceber a Sua verdadeira natureza, então como seria possível para nós? Porque é que Baba não tinha previsto este incidente e tê-lo prevenido? Se Baba é mesmo Parama Purusa e sabe tudo, então como é que deixou que isto acontecesse?

Estas perguntas remexiam incessantemente a minha cabeça. Para piorar as coisas, os margiis continuavam a perguntar, “Se Baba não conseguia controlar nem a sua esposa, como é que pode controlar os Seus discípulos? Como é que pode controlar o Universo? Como é que pode criar e estabelecer uma missão espiritual? Não estavam também a fazer meditação aqueles que o deixaram? E se estavam, como é possível sofrerem esta queda espiritual? Se não há garantia de, com a sadhana, estarmos seguros, então para que é que nós meditamos?”

Fiquei cada vez mais perturbado, era incapaz de responder a todas estas perguntas difíceis e, por vezes, embaraçadoras. Não eram só os margiis que procuravam respostas, eu também queria algumas para libertar a minha confusão.

Neste estado de agitação mental, uma força misteriosa empurrou-me para ir a Patna ver Baba pessoalmente, embora a minha mente objectiva não se quisesse encontrar com Ele. Na verdade, eu estava zangado com Baba por deixar que estas circunstâncias aparecessem.

Após chegar a Patna, decidir comer o pequeno almoço. Pensei que primeiro ia descansar um pouco e depois tomar banho. Após isso, ia meditar. Só o facto de eu adiar a minha meditação para o final de tudo o resto mostra claramento o estado confuso em que estava. Não tinha informado ninguém da minha visita, porque não me apetecia encontrar ninguém.

Comprei a comida e fui até ao edifício onde os dadas ficavam em Patna. Por alguma razão, no momento em que cheguei, senti-me tão desconfortável que tive que tomar um banho. Após um banho frio, mas refrescante, comecei a tremer. Estavamos no mês de Novembro e o inverno já tinha chegado com os seus ventos gelados. Tentei pôr o meu turbante, só para tentar evitar o ar frio.

Enquanto punha o turbante, o dada que era agora assistente pessoal de Baba entrou de rompante no meu quarto e disse, “Baba está a chamar por ti imeditamente”. Puxou-me para dentro do seu carro sem me dar qualquer hipótese de me preparar.

No caminho de carro, pensei para mim mesmo como é que Baba sabia que eu tinha acabado de chegar a Patna apenas há 40 minutos? Quem o teria informado? Poucos minutos depois chegamos à residência de Baba.

No momento em que cheguei, ouvi a campaínha de Baba tocar. O assistente pessoal correu imediatamente para o Seu quarto. Quando abriu a porta, vi Baba sair com um lindo e extraordinário sorriso e uma expressão encantadora. Prostrei-me perante Ele. Baba disse-me numa voz doce, “Vamos dar um passeio.”

Baba entrou no carro e eu entrei com ele. Não disse nada, apenas me sentei num silêncio profundo ao Seu lado. Embora a distância física entre nós fosse de apenas alguns centímetros, internamente sentia um grande distância. Isto era devido às perguntas incessantes que não saíam da minha mente e que tinham destruído a minha paz mental. Tinha medo de olhar para Ele. Baba também se manteu em silêncio durante a viagem de carro. Após algum tempo, o carro chegou a um caminho. O condutor encostou e parou o carro. Saímos do carro e eu segui os passos de Baba.

Andamos em silêncio pelo caminho, seguidos por mais dois voluntários. O guarda-costas de Baba caminhava ao Seu lado, segurando um chapéu para tapar o sol. Eu caminhava um pouco atrás de Baba. Enquanto andavamos, subitamente Baba virou-se para mim e olhou-me com um misterioso sorriso. De alguma forma, senti internamente que Baba estava contente comigo. Aquele sorriso fez-me sentir isso, tal como um raio-X, Ele estava a ver tudo na minha mente. Ele parecia tão doce, inexplicavelmente doce. Senti-me com mais esperança, que Ele fosse responder a todas as minhas difíceis perguntas. Existe uma regra nos passeios com Baba: ninguém deve fazer perguntas a Baba, apenas responder às Suas questões. Mas nessa altura, eu simplesmente não me consegui controlar e atirei as regras ao vento. Rebentei, dizendo “Baba, aqueles que Te deixaram, já não voltam?”

Baba não respondeu à minha pergunta. Em vez disso, atirou-me outra questão “Podes-me dizer o que é sadhana?”

Eu respondi, “É um processo científico através do qual a mente unitária se funde com a Mente Cósmica e, finalmente, com a Consciência Suprema.”

Baba confirmou com um gesto com a cabeça e disse, “Não é só como 2+2 = 4”. Eu pensei para mim “Eu sou um acarya e avadhuta. Eu já iniciei tantas pessoas. Sempre disse a toda a gente que sadhana é uma ciência espiritual, tal como 2+2=4. Mas agora Baba diz que é algo completamente diferente.”

Baba continuou, “Supõe que começas a escalar uma montanha e cais pouco depois de teres começado. Nada de sério te deve acontecer. Talvez sintas algumas dores e faças alguns ferimentos. Mas se subires um pouco mais alto e depois caires, então podes-te ferir a sério. Podes partir um braço ou uma perna. Agora, se estiver já no topo da montanha, muito lá em cima, e caires, então quase de certeza que vais morrer.”

Baba continuou, “Se estiveres a caminhar e caires, podes-te simplesmente levantar, sacudir a poeira e continuar a andar. Se fores numa bicicleta e caires, podes-te aleijar mais seriamente. Se caíres de uma motorizada os ferimentos podem ser mais graves. Se caíres de um comboio em movimento são ainda piores que isso. Se caíres de um avião, certamente que morres. E se caíres de um foguetão, o teu corpo pode nem chegar a aterrar neste planeta.”

Enquanto ouvia, entrou na minha mente o pensamento que Srimati Uma e o grupo de dadas que tinham saído poderiam nem voltar como seres humanos, porque quanto mais alto se vai na espiritualidade, mais dura é a queda. E poderá levar-lhes muito, muito tempo até recuperar o estado de ser humano, para que possam continuar a sua jornada espiritual. A sua queda é equivalente ao cair de um foguetão. Baba continuou a explicar que quando alguém caí espiritualmente, pode nem saber qual foi a verdadeira causa. Pode dizer que foi um acaso ou um acidente. Mas tudo o que acontece neste universo é incidental, nada é acidental. É apenas devido à nossa ignorância, à nossa falta de conhecimento e de compreensão que não sabemos a causa de um evento e, por isso, dizemos que foi um acidente.

Pensei para mim mesmo, porque é que Baba me está a dizer todas estas coisas? Eu apenas lhe coloquei uma pergunta simples: eles iam voltar ou não? Mas a resposta de Baba parecia-me completamente ao lado. Qual seria a ligação entre estas pessoas que nos deixaram, sadhana e cair de montanhas, comboios e aviões? Estava a tentar perceber a ligação entre todas estas coisas e tentar tirar algum sentido delas.

Subitamente, enquanto me entretia com estes pensamentos, Baba olhou para mim e fez-me sinal para ir para o Seu lado. Baba disse, “Vou-te explicar o que é sadhana.” Explicou então que existem dois tipos de sadhana: uma do sistema védico e outra do sistema tantrico. O sistema védico de sadhana não implica práticas espirituais baseadas nos Vedas. Refere-se ao sistema de sadhana baseado na reza. Não existe um processo prático de meditação ou outras práticas espirituais. Não existe a percepção da importância do Guru, não existe abhisheka, e não há garantias de libertação. Muitas vezes, o objectivo do sistema védico de prática espiritual é materialístico. Por outro lado, a sadhana Tantrica, é baseada num sistema de meditação e realização espiritual. O Guru é da mais elevada importância. Abhisheka é uma parte integral desse sistema e, para além disso, existe a garantia da salvação ou libertação.

À medida que Baba falava, eu só ficava mais confuso. Como é que eles poderiam ter um queda do caminho espiritual se o sistema tântrico garante a libertação e salvação? Também não sabia o que era “abhisheka”. Nunca tinha ouvido esta palavra antes.

Nesse momento, Baba perguntou-me, “Percebes?” Nem sabia o que responder. Então, Baba disse, “Olha, quando recebes a iniciação, primeiro fazes um juramento. Abhisheka significa juramento. Sabes que Krsna tomou o juramento de Yudhisthira. No final da guerra Mahabharata, Krsna pediu a Yudhisthira para jurar, ‘Desde este momento, juro que enquanto rei eu vou olhar por todos os meus súbditos como meus filhos e filhas. Vou tomar responsabilidade total pelo seu desenvolvimento em todas as esferas’. Yudhisthira fez este juramento perante Krsna, sentado na estrela de seis pontas chamada Bhaeravi cakra, que é agora parte do nosso pratik. Este símbolo místico foi cravado em pedra. Esta pedra onde eles se sentaram está enterrada onde é agora o Red Fort em Nova Delhi. Se os arqueólogos fossem explorar essa área, iam encontrar essa mesma pedra. Isto é abhisheka. Sem fazer esse juramento, sadhana é impossível. A partir do momento em que fazes o juramento, o Guru imediatamente segura a tua mão.”
Baba demonstrou-me então isto, segurando o Seu pulso esquerdo com a Sua mão direita.

Continuou, “A segunda parte do juramento Tântrico é Guru daksina – a oferta mental ao Guru que é feita no final da iniciação. E no momento em que se faz Guru daksina, agarra-se a mão do Guru.”

Então, ainda segurando o Seu pulso esquerdo com a mão direita, Baba agarrou o pulso direito com a Sua mão esquerda. “Isto cria uma ligação”.

Desta forma, Baba demonstrou que quando a nossa mão agarra o Guru, Ele simultâneamente agarra a nossa mão, trancando ambas num laço muito especial. Este é o ponto inicial de Sadhana.

Baba elaborou mais este ponto, dizendo: “Para se fazer algo com sucesso, são necessárias três coisas: confiança, utilização de objectos materiais; e a Sua graça. Se fizeres um trabalho físico qualquer, como cortar madeira, podes ou não ter fé n’Ele. Não afecta o resultado desse trabalho físico. Mas os dois primeiros requisitos devem estar claros na tua mente para conseguires ter sucesso na tarefa. Supõe que queres conduzir um carro. Se não tiveres confiança e se não souberes como conduzir, então não o podes fazer. Podes ou não ter fé n’Ele. Podes ou não ter um sentimento especial pelo Guru. Não interessa. Mas no caminho espiritual, auto-confiança e objectos materiais não são muito importantes. Guru krpa, a graça do Guru, é a única coisa que os aspirantes espirituais precisam. O seu caminho, desde a iniciação até nirvikalpa samadhi, é chamado sadhana. Para tarefas mundanas uma pessoa basta ter confiança e ter a assistência do mundo material. Mas na espiritualidade apenas um requisito é necessário – a entrega completa ao Guru. Uma pessoa pode ou não saber detalhadamente técnicas avançadas de meditação. Pode ou não ter conhecimentos profundos da ciência espiritual. Mas isto não significa que essa pessoa irá necessariamente ter progresso no caminho espiritual. No entanto, nesse caminho espiritual, se essa pessoa simplesmente entregar tudo ao Guru, vai conseguir obter tudo.”

Baba continuou, “Esta é a razão pela qual o caminho espiritual é tão simples e também tão difícil. É o caminho da síntese, não da análise. Se simplesmente te renderes a Ele, Ele toma total responsabilidade por ti – seja no nível mundano, físico, mental ou espiritual.”

Baba deu mais ênfase a este ponto, “Desde o ponto inicial de sadhana até ao destino final, tem-se que passar por muitos testes, muitos exames. No caminho espiritual, existem sete tipos diferentes de testes que os discípulos terão que enfrentar em diferentes alturas das suas vidas. Por vezes, os aspirantes espirituais podem ter consciência desses testes. Outras vezes, podem estar complemente inconscientes deles. Estes testes variam de pessoa para pessoa de acordo com os seus samskaras, estados mentais e níveis de entrega. Os testes podem ser mais físicos, psíquicos ou espirituais. Por esta mesma razão, logo após a iniciação, uma pessoa pode ficar doente, sofrer perdas financeiras, ou desenvolver um grande conflito com familiares, ou outros tipos de tortura mental.”

Baba disse, “Supõe que estás a ir de Calcutá para Deli. Ele pode pôr-te num comboio normal, ou pode pôr-te numa carruagem com ar condicionado. Se é com ar condicionado, podes nem te aperceber das várias estações que vão passando. Podes não te aperceber do encantador panorama que passa do lado de fora, que é uma tentação para os aspirantes espirituais. Mas se Ele te colocar num comboio normal, vais estar mais atento e ver Patna, Varanasi, Allahabad e por aí adiante. Imagina que o comboio chega a Allahabad. Podes decidir sair do comboio para comprar alguns doces ou frutas. Mas o perigo é que o comboio pode arrancar sem ti. Então, os testes podem vir de formas muito normais ou de formas muito difíceis. Depende apenas do Guru em que tipo de comboio é que és colocado, de acordo com os teus samskaras. A maioria dos sadhakas vai encontrar muitos problemas, como problemas de finanças, saúde, perda de prestígio e oposição de amigos e familiares”.

Continuou, “Normalmente, existem sete estágios ou tipos de testes”. Baba usou uma palavra em particular “nivedita prana”, que significa “viver apenas para Ele”. Ele disse, nivedita prana significa que os discípulos não só se renderam internamente, também se renderam externamente. Entregaram-se tanto que até o seu respirar e a sua força vital é controlada pelo Supremo. Para aqueles que “entregaram a vida e a alma”, o Guru decide tudo nas suas vidas.

Então, Baba continuou, “Mas, sabes, o teste final serei Eu a dá-lo pessoalmente. Sabes qual é o teste final? Vou criar na mente do discípulo confusão e dúvidas sobre o Guru. Vou criar uma atmosfera, um ambiente tal, que o discípulo perde toda a fé no Guru”.

Quando ouvi ista frase aterradora pensei para mim mesmo qual seria a capacidade de um discípulo de ultrapassar tal dificuldade.

Fiquei bastante chateado e perguntei “Baba, se dás este tipo de teste, como é que é possível que um discípulo o supere? Pensei que, enquanto Sadguru, garantias o sucesso de todos aqueles que Te seguissem. A mente unitária é muito limitada. Esse Teu teste é tão difícil que os discípulos podem facilmente perder a fé. Podem-se perder. Podem cair. Isto significa que na verdade, não há mesmo garantias de salvação.”

Baba respondeu imediatamente, “Não te preocupes. Quando dou este teste, também crio a atmosfera que permite ao discípulo passar. Forneço as pistas suficientes para proteger o discípulo. Faço ambas as coisas simultaneamente. O Guru cakra é apenas para o Guru. Se alguém manter o Guru no seu Guru cakra, o Guru irá definitivamente proteger essa pessoa. As pessoas que saíram, estavam a manter outra pessoa no seu Guru cakra, em vez do seu Guru. Por isso é que qualquer tipo de criticismo ou traição ao Guru é muito perigosa para um sadhaka.” Baba realçou de novo este ponto para mim , “Se uma pessoa Me mantiver no seu Guru cakra, será protegida por Mim.”

Depois perguntou-me, “Lembras-te que, antes deste incidente, eu dei imensos DMCs em tantos locais. Lembras-te o que disse aos margiis em todos os DMCs? Embora falasse de diferentes assuntos, em todo o lado eu repeti e expliquei um sloka:

Shriina’the ja’nakiina’the ca bheda Parama’tmanih
Tatha’pi mamah sarvashva srii Ra’ma kamalalocana.”

Baba explicou, “Narada e Hanuman eram ambos devotos de Deus. Um dia Narada perguntou a Hanuman, ‘Oh, Hanuman, porque é que tu não usas o nome de Narayana?’ Hanuman respondeu, ‘Eu sei que não existe diferença entre Rama e Narayana. Ambos são nomes de Parama Purusa. Mas o meu Ista mantra é Rama. Por isso eu só me interesso pelo nome de Rama’.” Baba disse, “Eu disse em todos os DMCs que, o vosso Ista (meta) é apenas um, a vossa Adarsha (ideologia) é apenas uma. Têm que se mover apenas em direcção a essa Uma Entidade.”

Baba continuou, “Vês, havia lá muitos devotos mas apenas alguns ficaram afectados. O Guru diz que Ista e Adarsha são um. Às vezes, dúvidas e confusões podem surgir na mente dos discípulos. Um discípulo pode pensar, ‘O Guru disse-nos para abrir uma nova escola, mas eu encontrei tantos obstáculos que a escola fechou. Porquê? Ele disse-nos para irmos a eleições, mas perdemos. Porque é que temos que lutar tanto contra a falta de fundos na organização?’ Se uma pessoa tentar analisar todas estas coisas intelectualmente, vai inevitavelmente ficar frustrada. O conselho do Guru é, no entanto, sempre o mesmo, ‘Sê um com o teu Ista. Sê um com a tua ideologia’.”

“Se deixares que tais dúvidas e frustrações entrem na tua mente, se ficares mentalmente exausto, então podes perder a força e largar a mão do Guru. Mas, ainda assim, o Guru não te larga. Ele vai-te continuar a levar em direcção ao teu objectivo. No entanto, se o discípulo disser, ‘Eu não acredito mais em Ti. Não és o meu Guru’, só aí o Guru irá largar a mão do discípulo, que irá certamente cair. Então, o que quer que aconteça, nunca deixes o teu Guru. Não caias no erro de tentar usar a tua mente limitada para analizar as infinitas qualidade do Guru. Ele sabe o que é melhor para ti, e Ele está sempre a fazer o que é melhor para ti. Ele nunca te vai largar se continuares a acreditar n’Ele.”

Baba explicou que os testes que Ele dá aos margiis não são muito difíceis. Ele disse que se fossemos estudar a história do tantra e vissemos os testes que gurus tantricos davam aos seus discípulos no passado, íamos perceber bem isto.

Depois, Baba perguntou-me, “Sabes como é que Krsna testou os pandavas? Não consegues imaginar. Ele matou Barbarik, o neto de Bhima (o segundo pandava), mesmo antes da guerra começar. Barbarik tinha-se vangloriado perante Krsna ‘Eu podia terminar esta guerra sozinho num piscar de olhos’. Ele até provou que tinha a capacidade para o fazer. Krsna, no entanto, matou-o devido à sua extrema arrogância. Isto foi um terrível teste para Bhima.”

Baba disse que Barbarik e muitos outros que Krsna matou antes ou durante a guerra Mahabharata eram poderosos avidya tantriks que utilizavam os seus poderes espirituais para ganhos pessoais. Injectavam complexos de medo na sociedade e oprimiam pessoas inocentes. Krsna, sendo uma manifestação de Parama Purusa, foi obrigado a destruí-los para o benfício da sociedade e restaurar o dharma.

Pensei para mim o quão grande haveria de ser a devoção de Bhima, para ter ultrapassado este teste. Krsna era o Guru do Dharma, da moralidade. Ele era um exemplo ideal para toda a humanidade. Baba disse, “Depois disso, Krsna matou Bhisma (o avô dos pandavas e kaoravas) de uma forma que era contra as regras da guerra naquela altura. E matou Drona (o professor de artes marciais) de uma forma enganadora.”

Baba explicou como Krsna testou Arjuna. Quando a roda da carruagem de Karna ficou presa na lama no meio do campo de batalha e ele se baixou para a retirar da lama, Krsna ordenou Arjuna que matasse Karna com uma seta nesse preciso momento. Arjuna ficou terrivelmente perturbado com a injustiça dessa ordem e gritou com Krsna, ‘Tu não és um verdadeiro amigo e Guru. Enquanto meu amigo, não me deves dizer para fazer coisas erradas. No entanto, disseste-me para matar o meu avô, Bhisma, de uma forma errada, e o meu professor, Dronacarya, também de uma forma que vai contra as regras da guerra. Eu sou um Ksattriya, um guerreiro, e Tu estás a instigar-me para mantar Karna de uma forma que também viola as regras da guerra. Isto é contra o dharma de um guerreiro’

Krsna respondeu com calma à sua reacção emocional, ‘Será que tenho que ouvir filosofia de ti no meio do campo de batalha? Aqui deves apenas lutar. Quando eras novo e a casa onde tu e os teus irmãos moravam apanhou fogo, quem te salvou? Quando Bhima foi envenenado e atirado ao riu, quem o salvou? Quem arranjou o teu casamento com Draopadii? Quem salvou a tua esposa, Draopadii, quando ela foi humilhada e torturada por Dushasan (um dos kaoravas) querer despi-la em frente daquelas pessoas que se diziam religiosas e moralistas? Foi tudo isso devido à tua capacidade enquanto guerreiro? Consegues-te lembrar que há uns dias atrás vários generais dos kaoravas mataram o teu filho, Abhimanyu? Foi isso de acordo com as regras da guerra?”
Arjuna percebeu de imediato o seu erro de julgamento. Os argumentos de Krsna convenceram Arjuna da sua grandiosidade. Recuperou assim a sua fé total em Krsna e ultrapassou o Seu teste.

Baba enfatizou, “Krsna deu aos pandavas tanta tortura, confusão, humilhação e sofrimento que nem consegues imaginar!”

Depois, Baba contou outras ocorrências para ilustrar os testes dos gurus tântricos e mencionou o nome de três discípulos tântricos – Upamanyu, Uyanka e Aruni.

Upamanyu recebeu do seu guru a ordem para tratar das suas vacas. Um dia, o guru exigiu que ele parasse de beber o leite das vacas, pois ele não lhe tinha dado permissão para tal. Seguindo esta instrução, Upamanya bebia apenas a espuma do leite que ficava por cima. O seu guru ordenou-o depois para também parar de beber a espuma do leite. Ele obedeceu. Para sobreviver, teve que pedir comida nas ruas. Após algum tempo, o seu guru também lhe ordenou que parasse de pedir comida a outros. Como ele tinha fé total no seu guru, Upamanyu obedeceu. Após algum tempo, como já não conseguia aguentar a fome, comeu algumas folhas, que lhe provocaram cegueira. Enquanto andava neste estado de cegueira, acidentalmente tropeceu e caíu num poço vazio.

Entretanto, quando as vacas regressaram sem Upamanya, o seu guru foi procurar por ele e, finalmente, encontrou-o numa má condição no fundo do poço. O seu guru teve pena dele e, do topo do poço, ensinou a Upamanyu um mantra especial que imediatamente o curou da sua cegueira. Upamanyu subiu para fora do poço e recebeu imediatamente iniciação e realização espiritual do seu guru. Tinha passado todos os testes com nota máxima.

Utanka foi enviado para morar com o seu guru quando tinha apenas cinco anos. Tinha que servir o seu guru até este estar completamente satisfeito. Dessa forma, ele passou muitos anos a servir o seu guru. Um dia, Utanka acidentalmente tropeçou enquanto carregava madeira. Caiu perto de uma corrente de água. Enquanto se levantava, viu o seu reflexo na água e ficou chocado por ver que o seu cabelo já se estava a tornar grisalho. Sentiu então que tinha desperdiçado toda a sua vida a fazer serviços manuais sem qualquer evolução espiritual, e isso tornou-o muito triste. Imediatamente após o seu retorno ao ashram, o seu guru iniciou-o e deu-lhe a experiência divina do samadhi.

O guru de Aruni, tinha-o ordenado a cuidar dos seus campos. Quando uma pequena barragem rebentou, Aruni bloqueou o buraco com o seu corpo. Permanecendo nessa posição para prevenir que a água saísse, acabou por perder a consciência. Ficou ali deitado na lama e na água a noite inteira. De manhã, o seu guru foi à sua procura. Após algum tempo, encontrou-o naquele estado lastimável e tratou dele até recuperar. Quando recuperou, declarou que Aruni tinha passado o seu teste e que agora estava pronto para a iniciação na prática espiritual.

Baba explicou que a prática tântrica da Ananda Marga também inclui testes, mas que são dados de forma diferente. Explicou que os elementos mais importantes do culto tântrico eram os testes dados pelo Guru aos seus discípulos e a satisfação completa do Guru. Clarificou ainda que Ele também mantinha estes elementos mas que os tinha modificado no sistema espiritual da Ananda Marga para que se ajustassem às condições presentes. Na Ananda Marga é muito fácil obter iniciação. Os testes vêm mais tarde quando diferentes clashes e problemas confrontam o aspirante espiritual e o distraem da sua prática. Se ele mantiver disciplina nas práticas espirituais após ultrapassar essas torturas da vida, o aspirante espiritual será finalmente recompensado com a realização espiritual.

Baba elaborou, “Quando eu agarro a tua mão, é a Minha responsabilidade levar-te até ao teu destino final. Se não seguires as Minhas directivas, significa que já removeste a tua mão da Minha. Mesmo assim, eu não posso largar a tua mão. Eu aceitei-te e vou-te levar até ao destino, quer tu sigas as minhas instruções quer não. Quer faças ou não sadhana, não importa. Mas a partir do momento em que digas ‘Eu não acredito em Ti. Eu não Te aceito como meu Guru’, então eu terei que te deixar.”

Baba colocou então duas perguntas e respondeu-as de seguida: “Qual é o verdadeiro significado de sadhana? Satisfazer o Guru é a tua sadhana. O que é Guru puja? Desempenhar as ordens do Guru é Guru puja.”

As longas e detalhadas explicações de Baba foram muito importantes para mim. Todas as perguntas que anteriormente me causavam confusão e problemas tinham desaparecido como fumo. As palavras de Baba foram muito claras para mim. Intuitivamente, percebi porque é que Ele me tinha dado o exemplo de cair de diferentes alturas e de diferentes veículos. Também percebi porque é que aquelas pessoas tinham deixado Baba e qual seria o seu destino. Percebi o verdadeiro significado da minha sadhana. Podemo-nos esquecer dos nossos deveres, mas Parama Purusa nunca se esquece dos Seus deveres e responsabilidade para connosco.

Caminhando junto a Baba nessa manhã fresca em Patna, chorei lágrimas de bem-aventurança. Percebi o Seu intenso amor por mim, e como Ele tinha removido as teias negras de confusão da minha mente e como tão gentilmente me tinha dado uma nova perspectiva sobre sadhana, salientado a importância da entrega e dependência total no Guru.»

in Living with Baba
Ac. Tapeshvarananda Avadhuta